terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Foi há cem anos que nasceu,
o poeta Vasco da Gama Rodrigues
A 27 de Janeiro de 1909 nascia, na pequena povoação do Paul do Mar, aquele que haveria de chamar-se Vasco da Gama Rodrigues.
Criança ainda, parece ter visto traçado o seu futuro. O mar estava ali, beijando a pequena povoação onde abriu os olhos para o mundo.
O mar, esse mar que leva e que volta a trazer, que inspira e encanta mas que, não raras vezes, se apodera para sempre das vidas de quem nele se aventura. Vasco da Gama Rodrigues, baptizado, dir-se-ia premonitoriamente com nome de navegador foi, criança ainda, levado para as terras da longínqua e misteriosa África.
Terá sido esse primeiro contacto com o salgado oceano que lhe introduziu nas veias o sabor a mar? Nem o poeta, certamente, o saberá dizer. Mas, o que é certo é que o mar, esse mar que, séculos antes foi lavrado pelas proas altivas das naus lusas,semeando sonhos em terras novas e desconhecidas, passou a fazer parte da sua alma. Primeiro da alma da criança que foi, depois do homem que se fez escritor. «E partiu.../O que estava/oculto/sepulto/no corpo/do Mundo/inteiro/se abriu.../Abriu-se/todo/ o Ignoto/remoto/excepção/do Graal e Prestes João./Voltou.../e ainda/antes do retorno/consentiu/Deus/outro Sucesso:/quis/ter/Um seu/Mensageiro/obreiro/quis/que Portugal/implantasse/a Vida, a Paz, o Amor/em todo/o Universo».

Uma poesia feita de sal e mar

A poesia de Vasco da Gama Rodrigues assume, sem sombra de dúvida, as características épicas de outros vates que cantaram a odisseia marítima de Portugal, qual “Mensagem” de Fernando Pessoa. Ela penetra a noite milenar dos tempos perdidos nos primórdios da nossa nacionalidade evocando a figura do nosso rei primeiro «Príncipe sou, Rei serei de nação/Meu sangue a tanto impele é meu escudo/Mas poder sê-lo falta quase tudo/Falta vencer a Sombra e o seu Dragão». Desce às profundezas marinhas para redescobrir o mito da Atlântida, o continente perdido algures no fundo do mar de onde lhe veio o nome, primorosamente pintado em “Os Atlantes”.
Vasco da Gama Rodrigues, qual argonauta da escrita, parte, em o “Cristo das Nações” com Prestes João em busca do novo mundo «Além do Mar, naquele Mar sem fim/Envolto de presságio e maldição/Quando buscava o reino de João/Eu vi o Mundo ao pé de mim/ Em toda a parte, lá por todo o lado/Onde se aloja a treva, a escuridão/À terra dei o Cristo da paixão/E fiquei dela todo apaixonado».

Um Portugal para além do “hoje”

Três são os livro que a pena de Vasco da Gama Rodrigues nos legou. ”Os Atlantes” a sua primeira obra escrita em 1961, quando o poeta contava já com 52 anos. A obra conta-nos, em verso e ritmo, a história do mito da submersa Atlântida, o continente perdido e cantado por mil poetas.
As “Três Taças” leva-nos por caminhos da História do Ocidente esse ponto cardeal de onde partiram homens em busca de muito orientes e diferentes povos.
“O Cristo das Nações”, editado já depois da morte do autor, transporta consigo, como refere o seu prefaciador “a ideia de um Cristo para todas as Nações, em que Nação e Cristo se fundem num propósito único – o da 'salvação humana' – através duma Alma Lusa ou de Luz”. Vasco da Gama Rodrigues, na sua obra poética, tal como Pessoa, foi capaz de ver Portugal para além do hoje. Esse Portugal que Pessoa descobriu na profecia do Monge Rolando: “(...) alegra-te ó Lusitânia, e tem por certa a esperança daquela vinda de que se duvidava. Apossar-te-ás do Império em toda a Orbe e os muros de Jerusalém cairão debaixo dos teus ceptros”. Cem anos decorreram sobre o nascimento do poeta. E Portugal cresceu. Mudou.
Fez-se mais terra, mas continua, como desde a hora primeira do seu nascimento, de olhos postos no mar e que do mar nunca fez barreira, mas destino. Esse mar que continua a ser vida e morte, mar de ir e voltar pelo qual se pauta grande parte da vida desta Nação, princípio e fim da Europa.
BIBLIOGRAFIA DO AUTOR

Vasco da Gama Rodrigues (1909-1991), era natural do Paul do Mar, Calheta, Madeira. Esteve radicado em Moçambique, mas acabou por regressar a Portugal, onde ingressou na Função Pública. Aos vinte e cinco anos era Inspector de Turismo. Colaborou literariamente em órgãos de imprensa, vindo, já com mais de meio século de existência, em 1961, a publicar o seu primeiro livro, "Os Atlantes" e, em 1972, "As Três Taças". O volume "O Cristo das Nações" (sua terceira obra, por si organizada), foi editado, postumamente, em 1995. A Câmara Municipal de Lisboa deliberou integrar o seu nome na toponímia da cidade, estando também patente na sua freguesia natal, na Madeira, a homenagem que lhe foi prestada, com a inauguração de uma placa na casa onde nasceu e passou os seus primeiros anos de vida, antes de partir para África. Está representado no volume "Paul do Mar... Do nascer ao Pôr do Sol", de Paulo Garcês e Zita Cardoso, Colecção História Local, Edição Arguim-Madeira, 2003.Fonte: Jornal da Madeira /Octaviano Correia